O Campeonato Carioca Feminino Adulto teve início em setembro e as atletas já começaram a ser julgadas no TJD-RJ. A Primeira Comissão Disciplinar pegou o caso de Vitória e Alessandra, do América e da Portuguesa, respectivamente, e suspendeu as duas em quatro jogos, por troca de agressões. A Lusa voltou a responder, desta vez por uma briga generalizada com o Cruzeiro, onde ambos foram multados pela Sexta Comissão. Porém, as mulheres não estão presentes apenas na figura do denunciado, mas também na formação e funcionalidade do Tribunal.
Atualmente são cinco auditoras divididas entre as oito Comissões Disciplinares e o Pleno: Dra. Renata Mansur (Pleno), Dra. Renata Deschamps (1ªCD), Dra. Isabela Neves (3ªCD), Dra. Ana Carolina Soares (6ªCD) e Dra. Cristiane Carvalho (6ªCD). Na Procuradoria são mais três profissionais: Dra. Clarissa Lugarinho, Dra. Karina Saltoun e Dra. Rita de Cássia de Lima. A Secretaria do TJD-RJ é composta exclusivamente por mulheres, sendo Eliane Neno a Secretária Geral e Amanda Garcia, Márcia Cristina e Rosangela Rodrigues secretárias adjuntas.
Cada vez mais as mulheres vão ocupando espaço em ambientes predominantemente masculinos, mas chegar até esses lugares ainda é um desafio. A cultura no machismo exige que se prove e reafirme a capacidade de estar em determinadas funções. A pioneira em um Tribunal Desportivo do Futebol foi a Dra. Renata Mansur, primeira mulher a integrar uma Comissão e presidir uma Comissão da categoria. O ano foi 2008 e Renata estava grávida de oito meses.
– Confesso que quando cheguei com aquele barrigão todos os homens presentes no recinto me olharam de cima a baixo, com aquela cara de “o que essa mulher faz aqui?”. Minha percepção foi a de que a todo momento faziam questão de falar sobre regras de jogo (escanteio, pênalti, etc) e não disciplinares, para deixar bem claro que mulher não entende nada de futebol. Ocorre que conheço um pouco das regras de jogo, mas para julgar no TJD é necessário o conhecimento técnico do Direito Desportivo e, claro, as regras do CBJD – contou Renata Mansur, que até 2012 era a única mulher.
Segundo a auditora do Pleno, além de formação e capacidade, é preciso ver e ser vista para ingressar nas vertentes do Direito Desportivo.
– Hoje não tenho mais dificuldade na convivência e tenho certeza que abri as portas para as outras que vieram, mas o início foi bem complicado. Um bom caminho para as meninas que se interessem pela área deve ser a frequência em cursos e palestras, para que possam conhecer os profissionais que atuam no ramo. Atualmente sou auditora do Pleno do TJD do Futebol e Diretora Jurídica da Federação de Atletismo do Estado do Rio de Janeiro. Portanto, a área desportiva não se restringe somente à auditoria, mas permeia vários caminhos. Que venham as meninas – finalizou.
Coincidências à parte, no ano de 2012 uma outra auditora ficou conhecida pela inédita prisão em flagrante de membros de uma torcida organizada de um clube carioca. Cristiane Carvalho exercia a função de Delegada e acabou se envolvendo com diversos encontros e congressos que tinham como tema a violência no futebol. Posteriormente se especializou na área, o que a trouxe até o TJD-RJ.
São conhecidas as dificuldades que o futebol feminino encontra, inclusive em junho do ano corrente aconteceu o 1º Seminário Internacional de Desenvolvimento do Futebol Feminino, que reuniu especialistas para debater sobre o crescimento da modalidade e foi organizado pela Dra. Luciana Lopes, outra mulher atuante no Direito Desportivo. Apesar dos problemas enfrentados e das poucas oportunidades, durante um julgamento no TJD-RJ o que prevalece são os critérios técnicos.
– As mulheres são julgadas com o mesmo rigor que utilizamos para os homens, pois as atletas femininas são tão bem capacitadas e técnicas quanto os atletas masculinos, não havendo qualquer motivo para que seja feita diferenciação no momento do julgamento. Apesar do desenvolvimento do futebol feminino ter como marco uma história de luta contra a discriminação das mulheres na sociedade, nós, mulheres, conquistamos nosso espaço por nossa eficiência, capacidade, organização e determinação – afirmou Cristiane.
Do lado oposto de quem julga estão os advogados de defesa e lá também a figura feminina se faz presente. O TJD, por exemplo, conta com as presenças constantes das advogadas Anália Chagas, Ana Luiza Antunes, Daniela Martins Lopes e Ester Freitas, sendo esta última atuante desde 1994, quando iniciou a carreira desportiva na FERJ,
Dra. Ester foi advogada da Federação até o ano de 2011. A partir daí passou a defender os árbitros junto com o Dr. Giuliano Bozzano. Após a saída de Giuliano, Ester assumiu também as defesas no STJD dos profissionais filiados à ANAF.
– Por ser um meio predominantemente masculino, não é muito fácil atuar na área desportiva, ainda mais porque a maioria acha que nós mulheres não entendemos nada de futebol. Quando se fala de árbitros então, na maioria são lances interpretativos que são inerentes a eles, é imprescindível que além do conhecimento das regras do futebol, se conheça também a dinâmica de como é realizada uma partida e seus meandros – explicou Ester.
Ainda que de forma gradativa e esbarrando em pré-conceitos baseados no machismo que está culturalmente incutido na sociedade, as mulheres estão alçando voos mais altos, o que, tempos atrás, para muitos era algo que não se podia imaginar.
Elise Duque/Assessoria TJD-RJ